Infância violada: na semana de combate ao trabalho infantil, STAS ressalta importância da conscientização
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Mãos pequeninas trocam o lápis de cor pelo cabo da enxada, a brincadeira de esconde-esconde dá lugar à caixinha com bala de goma a ser vendida no semáforo, o planejamento do futuro é substituído pelo trabalho braçal exigido no lixão. São algumas das situações enfrentadas por crianças diariamente. Na semana de combate ao trabalho infantil, explícita violação dos direitos humanos e um dos maiores problemas sociais do planeta, a Secretaria do Trabalho e Assistência Social (STAS) reforça a importância de conscientização da população.
Conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o trabalho infantil é ilegal e priva crianças e adolescentes de uma infância normal, impedindo-os de frequentar a escola e desenvolver suas capacidades e habilidades de forma saudável. Atualmente, os dados de identificação de casos no Rio Grande do Sul estão desatualizados e são subnotificados, e estão concentrados na plataforma Observatório da Prevenção e da Erradicação do Trabalho Infantil. No Brasil, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2016, foi identificado 1,8 milhão de casos de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil. No Rio Grande do Sul, conforme o Observatório da Criança e do Adolescente, da Fundação Abrinq, foram registrados mais 150 mil casos. Os maiores índices de trabalho infantil são registrados no interior do Estado.
De acordo com a equipe de Proteção Social Especial de Média Complexidade, do Departamento de Assistência Social da STAS, o fator pode ser explicado pela razão da movimentação na estrutura de produção nas cidades gaúchas. “A agropecuária, por exemplo, é um setor caracteristicamente associado à maior incidência do trabalho infantil. Há, ainda, dificuldade de fiscalização e monitoramento dessas atividades”, explica a assistente social e analista de políticas públicas e projetos da STAS, Ivanara Gomes. Considerando as atividades econômicas desenvolvidas no Estado, há crianças e adolescentes em trabalho infantil nas atividades agrícolas, pedreiras, carvoarias, olarias, lava jatos, lixões, comércio ambulante, indústrias calçadistas (quarteirização da mão de obra), trabalho doméstico, atividades com manuseio de produtos químicos e outros.
A equipe de Proteção Social Especial de Média Complexidade destaca que o padrão de sociedade desigual sustenta que o trabalho infantil é causa e efeito da pobreza das comunidades gaúchas e, ainda, da ausência de oportunidades para o amadurecimento de suas capacidades. “O engajamento da população no enfrentamento ao trabalho infantil é, ainda, uma das barreiras que devem ser vencidas, embora o ingresso precoce ao mundo do trabalho encontre respaldo em discursos naturalizados e enraizados, como: ‘o trabalho da criança/adolescente ajuda a família’, ‘é melhor trabalhar do que ficar nas ruas’, ‘é melhor trabalhar do que roubar’, ‘a criança que trabalha fica mais esperta’ e ‘quem começa a trabalhar cedo garante o futuro’”, exemplifica a secretária do Trabalho e Assistência Social, Regina Becker. “Considerando que o trabalho infantil é um fenômeno multicausal, precisamos fazer a nossa parte, enquanto sociedade, e proteger as nossas crianças e adolescentes, sobretudo em momentos de pandemia que estamos vivendo", complementa.
Reflexão
Esta é uma data importante para reflexão. Conforme a assistente social e analista de políticas públicas e projetos da STAS, Simone Peña, é necessário considerar que, diante das pactuações e normativas internacionais e nacionais, além de todo o dano causado a crianças e adolescentes, o enfrentamento ao trabalho infantil é uma pauta que deve estar em destaque no cotidiano das instâncias operadoras de direito que trabalham pela proteção. “Causas culturais, estruturais e econômicas estão no cerne dessa problemática que, ainda hoje, persiste e precisa ser combatida. A infância e a adolescência são fases fundamentais para o desenvolvimento do sujeito, já que se trata de um período marcado pelo crescimento físico e psíquico e pelo desenvolvimento social, intelectual, cultural e de cidadania”, ressalta Laurene Paim Cardozo, assistente social e analista de políticas públicas e projetos da STAS.
Dessa forma, as ações de proteção à infância e adolescência devem buscar superar e promover a ruptura dos elementos de naturalização e legitimação dessa violação de direitos. Nesse sentido e, dado o contexto da pandemia do novo coronavírus, onde é possível prognosticar o avanço das diversas expressões de violência e violação direitos, é fundamental o fortalecimento, “além da construção de uma agenda intersetorial ampliada para o enfrentamento ao trabalho infantil, numa perspectiva que integre e articule, minimamente, as políticas de Assistência Social, Saúde, Educação, Esporte, Cultura e Lazer, com intuito de potencializar esforços na identificação, atendimento e acompanhamento das crianças, adolescentes e famílias em situação de trabalho infantil”, destaca Simone.
Planejamento para o combate ao trabalho infantil no Estado
A STAS possui ações previstas no Plano de Trabalho da Proteção Social Especial de Média Complexidade de 2020, que possui, entre suas atribuições, prestar apoio técnico aos trabalhadores e gestões do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) sobre o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e coordenar a Comissão Estadual do PETI (CEPETI).
Uma das ações consiste na articulação com os setores da STAS para o desenvolvimento de ações estaduais de enfrentamento ao trabalho infantil, como: monitoramento dos municípios gaúchos a partir dos Sistemas Informações do Sistema Único de Assistência Social (SUAS); planejamento e organização de ações de educação permanente para os trabalhadores do SUAS; articulação com a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (Seplag) para elaboração do Plano Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador e elaboração do Plano Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador, em articulação com a CEPETI.
As iniciativas da STAS convocam a população gaúcha a colaborar no enfrentamento ao trabalho infantil e na denúncia de casos de violação dos direitos de crianças e adolescentes.
Denuncie!
Disque 100: o número atende todo território nacional. Você pode escolher se identificar ou permanecer anônimo.
Procure: Conselhos Tutelares, Conselhos da Criança e Adolescentes, Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Delegacias de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente e Núcleos especializados em infância e juventude da Defensoria Pública, do Ministério Público Estadual ou do Ministério Público do Trabalho.
Práticas a serem adotadas pela população no combate ao trabalho infantil
? Compreender o seu papel crucial na proteção das crianças e adolescentes;
? Não comprar nenhum produto de crianças e adolescentes, assim como não dar esmolas, evitando perpetuar o ciclo do trabalho infantil e seus possíveis desdobramentos como: evasão escolar, comprometimento do estado de saúde e exposição às diversas formas de violência e exploração.
? Não utilizar a mão de obra infantil;
? Pesquisar a procedência dos produtos, a fim de evitar consumir aqueles procedentes da exploração de mão de obra infantil;
? Acionar os canais denúncia.
Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil
12 de junho
Foi instituído pela OIT em 2002, ano da apresentação do primeiro relatório global sobre o trabalho infantil na Conferência Internacional do Trabalho. No Brasil, o 12 de junho foi instituído como Dia Nacional de Combate ao Trabalho Infantil pela Lei Nº 11.542/2007.
O que é o trabalho infantil?
De acordo com terceiro Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador (2019-2022), o termo trabalho infantil se refere às atividades econômicas e/ou atividades de sobrevivência, com ou sem finalidade de lucro, remuneradas ou não, realizadas por crianças ou adolescentes em idade inferior a 16 anos, ressalvada a condição de aprendiz a partir dos 14 anos, independentemente da sua condição ocupacional. Toda atividade realizada por adolescente trabalhador, que, por sua natureza ou pelas circunstâncias em que é executada, possa prejudicar o seu desenvolvimento físico, psicológico, social e moral, se enquadra na definição de trabalho infantil e é proibida para pessoas com idade abaixo de 18 anos.
Crianças e adolescentes em acompanhamento com registro no SUAS
Conforme as informações do Sistema de Registro Mensal de Atendimento (RMA), que compõem a base de dados do Sistema de Autenticação e Autorização (SAA), há 1.370 famílias com crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil estavam inseridas em acompanhamento no Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) ou Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) em 2019. Confira na tabela (.odt 18,24 KBytes) a idade média e percentuais de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil e que estão em acompanhamento com registro no SUAS.
Como identificar o trabalho infantil
Os principais tipos de trabalho infantil descritos nas orientações técnicas de gestão do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) são:
Os trabalhos realizados nas ruas: a realização de trabalho nas ruas antes dos 18 anos de idade é proibida desde a edição da Consolidação das Leis do Trabalho em 1943. A proibição deve-se à natural falta de atenção das crianças e adolescentes que, nas ruas, estão sujeitos a um maior risco de acidentes e perigos
O trabalho infantil doméstico: caracteriza-se por sua invisibilidade e, por realizar-se no espaço privado, isso dificulta sua fiscalização. Em regra, é de fácil caracterização quando executado em casa de terceiros, mas encontra problemas quando realizado na própria casa ou na de parentes, pois oculta-se entre muros domiciliares, com prerrogativa de inviolabilidade, conforme estabelece o artigo 5º da Constituição Federal. O trabalho infantil doméstico se distingue da realização de tarefas domésticas ou afazeres.
O trabalho em atividades ilícitas: associado ao tráfico de drogas, é vedado - assim como aos adultos - caracterizado como uma das piores formas de trabalho infantil. É fácil constatar que a prática ilícita se caracteriza como trabalho, já que a maioria das relações se dá com: subordinação, continuidade, remuneração e pessoalidade.
O trabalho informal: todo trabalho até 14 anos é proibido. A conquista dos direitos da criança e do adolescente se deu não somente para a preservação dos limites de idade mínima para o trabalho, mas também para a garantia ao adolescente de todos os direitos trabalhistas e previdenciários que não devem ser negligenciados. O registro na carteira garante todos os direitos inerentes a qualquer trabalhador, portanto trabalho protegido para adolescentes deve ser sempre formalizado.
O trabalho eventual/sazonal: caracteriza-se por não ser permanente e sim esporádico. Mesmo que o trabalho desenvolvido não seja permanente ou que tenha pequena carga horária, a legislação brasileira não permite a realização de qualquer trabalho antes dos limites de idade mínima. A eventualidade do trabalho não descaracteriza sua proibição.
O trabalho noturno: entende-se por trabalho noturno nas áreas urbanas, aquele realizado no período compreendido entre 22 horas de um dia até as 05 horas do dia seguinte e nas áreas rurais, aquele realizado no período compreendido entre 20 horas de um dia até as 04 horas do dia seguinte.
O trabalho em atividades rurais: é bastante diversificado e heterogêneo. As crianças e adolescentes podem tanto estar inseridos em atividades da agricultura familiar quanto para produtores com quem não têm parentesco. Entre as práticas mais comuns no setor estão o cuidado com os animais (pecuária, avicultura, suinocultura, etc.) e na agricultura propriamente dita (lavouras, pulverização de agrotóxicos, aragem da terra, colheita de cereais e frutos, capinagem, corte de cana etc.). Via de regra são trabalhos manuais, extenuantes, ao sol e que expõem os pequenos a agravos de saúde e prejuízo de seu crescimento.
O trabalho perigoso e insalubre: este tipo de trabalho é tema central na Convenção nº 182 da OIT, que embasa a proibição das piores formas de trabalho infantil com ações urgentes para sua erradicação. O Governo Federal ratificou esta convenção e a recomendação nº 190 da OIT por meio do Decreto nº 3.597, em 12 de dezembro de 2000. A Convenção 182, em seu artigo 4º, estabelece que os tipos de trabalho a que se refere os trabalhos que por sua natureza ou pelas circunstâncias em que são executados, são susceptíveis de prejudicar a saúde, a segurança e a moral da criança devem ser definidos pela legislação nacional ou autoridade competente, após consulta com as organizações de empregadores e trabalhadores.
Os trabalhos virtuais: são bastante recentes e exige mais estudos sobre os limites da participação de crianças e adolescentes nos meios virtuais como: blogs, vlogs, campeonatos de videogame on line, páginas em sites de relacionamentos que atraem anunciantes, prestação de serviços pela internet, entre outras novidades. Alguns riscos podem estar associados a estas práticas: hiperexposição da imagem e da vida pessoal; uso da imagem para fins pornográficos; bullying digital; perda do interesse pela vida fora das redes sociais; transtornos mentais decorrentes de dependência em games ou outras ferramentas virtuais; obesidade infantil, problemas de visão etc.
O trabalho artístico e desportivo: são as únicas exceções à regra constitucional sobre a idade mínima para o trabalho (além da aprendizagem profissional). Crianças e adolescentes podem realizar atividades artísticas antes dos 14 anos uma vez obedecidos as normativas vigentes e devidamente autorizado pela autoridade judiciária, em alvará onde se fixem as garantias de um trabalho protegido e que não traga prejuízos à formação da criança e/ou do adolescente. Já sobre a atividade desportiva de rendimento, apenas após os 14 anos de idade, de acordo com a Lei 9.615/1998, é que o adolescente pode estabelecer contrato formal com a instituição esportiva.
Consulte o Manual de Atuação do Ministério Público na Prevenção e Erradicação do TrabalhoInfantil.
Legislação e políticas públicas
Há princípios e regramentos estabelecidos na Constituição Federal de 1988, que estão em consonância com as disposições da Convenção dos Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas (ONU) e das Convenções nº138 e 182 da OIT, principais documentos internacionais que tratam sobre a temática. Além destes, são marcos legais importantes:
BRASIL
? Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (arts. 60 a 69);
? Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação das Leis dos Trabalhos. Título III, Capítulo IV, “Da Proteção do Trabalho do Menor”;
? Lei nº 10.097, de 19 de novembro de 2000 (ampliada pelo Decreto Federal nº 5.598/2005) – Lei da Aprendizagem;
? Lei nº 11.542, de 12 de novembro de 2007 – Institui o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Infantil;
? Decreto 6.481, de 12 de junho de 2008 – Define a Lista das Piores Forma de Trabalho Infantil (Lista TIP);
? Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011, que altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (LOAS) – Incluiu o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) como um programa de caráter intersetorial, integrante da Política Nacional de Assistência Social (PNAS).
RIO GRANDE DO SUL
? Portaria STCAS nº 18, de 05 de julho de 2005 – Institui a Comissão Estadual do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil;
? Lei Estadual nº 14.025, de 25 de junho de 2012 – Institui o Dia Estadual de Combate ao Trabalho Infantil.
Importância do ECA
A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, estabeleceu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que completa 30 anos neste ano e é o mais importante mecanismo de proteção integral à criança e ao adolescente no Brasil. O art. 5º afirma que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma de lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.